sábado, outubro 08, 2005


O teu retrato

Achei-te embalsamado num retrato que havia guardado no fundo de uma gaveta esquecida pelo tempo. Gastei-te com a ternura dos meus dedos até os sentir descarnarem-se.
Estás amarelecido, bafiento, boloroso, um coágulo de sangue esborratou os teus lábios e uma mancha de morte laminou-te o sorriso. Com a raiva de uma lágrima apago a dedicatória de letrinhas desenhadas a azul sobre o colo das tuas mãos. Mãos que faço minhas e com que te rasgo lentamente em mil pedaços de náusea. Sacrifico-te num altar de chamas. Enterro as tuas cinzas nas raízes putrefactas de uma árvore a quem roubaram a memória. Rio-me para os vermes a quem servirás de alimento.

Nascerá um poema ou um cardo?